O Sexto Poder - quem definirá sua reputação?

Uma infraestrutura invisível que hoje organiza a informação, o Sexto Poder atua como mediador das interações sociais e, em última análise, governa a visibilidade e o valor no mundo digital

Atualizado em 24/12/2025 às 08:12, por Redação.

Por Flavio Ferrari*

A teoria clássica da separação dos poderes, imortalizada por Montesquieu em "O Espírito das Leis" (1748), estabeleceu os três pilares que sustentam o Estado de Direito moderno: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Com a evolução social, política e tecnológica do ocidente, a essa tríade formal somaram-se outras forças igualmente decisivas. A Imprensa, em seu papel de vigilante e formadora de opinião, foi consagrada como o Quarto Poder, uma expressão atribuída a Edmund Burke.  Mais recentemente, a ascensão da internet e das redes sociais potencializou o que muitos teóricos denominam Quinto Poder, um termo que surgiu na década de 1960 com o jornal underground “Fifith Estate” e que passou a referenciar a opinião pública articulada de forma descentralizada e em rede.

No entanto, uma análise contemporânea que se limite a esses cinco poderes seria incompleta, ignorando a infraestrutura invisível que hoje organiza a informação, medeia as interações sociais e governa a visibilidade e o valor no mundo digital. 

Esta infraestrutura é composta por algoritmos. São eles que decidem quais notícias nos serão apresentadas, quais produtos serão sugeridos e com quem deveríamos nos conectar, definem a hierarquia de apresentação de conteúdo e, mais importante, qual versão de uma instituição, organização, marca ou pessoa se torna a sua realidade pública. Este poder de curadoria, classificação e ordenação social, exercido em escala planetária e em tempo real por sistemas computacionais complexos, constitui o que argumentamos ser o Sexto Poder, que se cristaliza com a ascensão das inteligências artificiais conversacionais.

O Sexto Poder se distingue dos demais por suas características únicas. Enquanto os poderes legislativo, executivo e judiciário são (conceitualmente) transparentes e sujeitos ao escrutínio democrático, e os poderes da mídia e da opinião pública operam em um campo de batalha de narrativas abertas e contestáveis, o poder algorítmico é exercido de forma silenciosa e obscura.

Ele não debate; ele ranqueia. Ele não persuade; ele filtra.

O lançamento do ChatGPT em novembro de 2022, e das demais IAs conversacionais que se seguiram, marcou o início de uma nova era. 

As IAs conversacionais estão mudando fundamentalmente como as pessoas buscam informações, com a “tradicional” lista de links sendo substituída por respostas diretas e sintetizadas. Como aponta Brian Snyder, estamos passando de "comprar cliques e tráfego para ganhar o endosso da IA".

As IAs não vendem (ainda) espaço publicitário em suas respostas; elas selecionam fontes com base em critérios de qualidade, autoridade e relevância, e é essa a moeda de troca.  Uma marca pode ter um orçamento publicitário ilimitado, mas se não tiver uma reputação sólida, não será citada positivamente de forma direta. Essa é uma mudança profunda que recoloca a construção de marca (branding) no centro da estratégia de marketing.

 

*Flavio Ferrari é fundador do hub SocialData, professor de análise estratégica de cenários futuros na ESPM e autor do livro “O Sexto Poder - Algoritmos, Inteligências Artificiais e Reputação Digital”