Embates com jornalistas "ativistas" são narrados em livro de ex-editor executivo do Washington Post

Redação Portal IMPRENSA | 05/10/2023 10:54
Ex editor-executivo do jornal americano The Washington Post, o jornalista Martin Baron acaba de lançar o livro "Colisão de Poder - Trump, Bezos e o Washington Post". 

Além de abordar as ações do ex-presidente dos EUA Donald Trump contra a mídia, o trabalho contempla a crise da indústria global de notícias, a compra do Washington Post por Jeff Bezos, dono da Amazon, em 2013 por US$ 250 milhões, e a renovação da imprensa com a chegada às redações de novas gerações de jornalistas.

Baron assumiu o Post poucos meses antes da venda do jornal para Bezos. Nos oito anos sob seu comando, o diário conquistou dez prêmios Pulitzer. O jornalista chegou ao veículo após chefiar o Boston Globe e a equipe de jornalismo investigativo que ganhou um Pulitzer por uma série de reportagens sobre abusos sexuais praticados por membros da Igreja Católica. 
Crédito: Justin Gellerson/NYT - reprodução FSP
Martin Baron: em seus oito anos à frente do Post, veículo ganhou oito prêmios Pulitzer
Orgulhoso da resistência do jornal ante os ataques do governo Trump, ele se mostra refratário aos anseios por maior representatividade nas redações. Por sinal, embates relativos ao tema teriam levado o jornalista a se aposentar em 2021, aos 66 anos. 

Racismo e assédio assexual

Enquanto alguns de seus comandados queriam emitir opiniões, Baron exigia que os jornalistas fossem objetivos, inclusive na cobertura de pautas sobre racismo da polícia e assédio sexual. Para ele, quando jornalistas opinam ou "fazem ativismo", comprometem sua credibilidade e a do veículo para o qual trabalham.

O livro narra o embate entre Baron e o repórter negro Wesley Lowery, que criticava pelas redes sociais a ausência da palavra racismo na cobertura da imprensa americana. Advertido pelo chefe, ele acabou saindo do jornal. Outra briga relatada no livro foi com a repórter Felicia Sonmez, que processou Baron por tê-la impedido de fazer matérias sobre abusos sexuais.

Baron chegou ao Post contratado pela família Graham, que comandou o jornal desde 1933, num período que abarcou pontos altos de sua trajetória, como a cobertura do caso Watergate, que levou à renúncia do então presidente Richard Nixon, em 1974, e a revelação de crimes de guerra do governo americano durante a invasão ao Vietnã.

Favorável a Bezos, o livro descreve como o dinheiro do bilionário ajudou a impulsionar o número de assinantes digitais do jornal, favorecendo sua receita publicitária na internet e permitindo a contratação de jornalistas. Uma das inovações que permitiram que esse processo ocorresse foi a ferramenta Bandito, que testa manchetes e imagens para determinar quais exercem maior poder de atração sobre os leitores. O livro também descreve a adoção pelo Post de um mecanismo que envia emails aos repórteres sobre o deadline das matérias. Segundo Baron, Bezos jamais interferiu nas decisões editoriais do jornal.

Com relação à guerra travada com Trump, o ex-editor executivo lembra ao longo do livro que o político usava o termo "inimigo do povo" para qualificar a imprensa e atacava Bezos e a Amazon com ameaças de retaliação. O livro também fala sobre críticas da esquerda ao jornal, que daria muito espaço para trumpistas. 

O livro também descreve como o Post adotou, em 2017, seu primeiro slogan em mais de 140 anos de história: "Na escuridão, morre a democracia". Baron conta que outro slogan ("Um povo livre exige saber") foi vetado pela então esposa de Bezos, MacKenzie Scott.