O sistema de recomendação automático do YouTube tem direcionado quem assiste ao canal oficial de Jair Bolsonaro para vídeos de apoiadores do presidente que disseminam desinformação sobre a pandemia de coronavírus, publicam conteúdos contra as instituições e são investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por associação a atos antidemocráticos.
Crédito:Reprodução / YouTube
A descoberta foi feita após um levantamento da Agência Pública nos dez vídeos com mais visualizações do canal do presidente em 2019 e 2020. Juntos, eles somam mais de 10 milhões de visualizações.
Entre os canais recomendados pelos algoritmos estão o do portal Folha Política, de propriedade de Ernani Fernandes Barbosa Neto, investigado em inquérito do STF que apura a organização de atos antidemocráticos.
Outros sete canais investigados pelo STF aparecem nas recomendações do YouTube através de vídeos de Bolsonaro:
Foco do Brasil, alvo de inquérito que apura a organização de manifestações contra as instituições democráticas no país;
Vista Pátria, que pertence a Allan Frutuoso, denunciado à CPMI das Fake News como parte de um esquema que cria e replica campanhas de ódio;
Terça Livre TV, de Allan dos Santos, investigado por participação na organização dos atos antidemocráticos e também no inquérito sobre fake news;
Giro de Notícias, Te Atualizei, Ravox Brasil, Bernardo Küster e Vlog do Lisboa, todos investigados ou denunciados em esquemas de desinformação e linchamentos virtuais.
Em depoimentos à Polícia Federal, os responsáveis pelos canais investigados por associação a atos antidemocráticos negaram ter compartilhado vídeos com informações falsas ou que incitassem animosidade das Forças Armadas contra as instituições democráticas.
Não investigados e canais da imprensa
Há também na lista dos canais mais recomendados pelo YouTube do presidente canais bolsonaristas não investigados: LiloVlog, Daniel Lopez, Valeria Bernardo – Deep State V, Luiz Viajante Bolsonaro 2022, Conhecendo os 2 Lados da Moeda e o CristalVox, este último que era apoiador do presidente, mas hoje tece críticas a ele.
Canais da imprensa também foram sugeridos, como o da CNN Brasil, rádio Jovem Pan, Bandeirantes e Record.
Entre os canais com posicionamento contrário ao presidente, foi recomendada a TV 247 – canal do site Brasil 247.
Bolsonaro indica pessoalmente canais investigados pela Justiça
A Agência Pública constatou ainda no levantamento que o direcionamento a canais investigados pelo STF a partir dos vídeos oficiais de Bolsonaro não vem apenas dos algoritmos, mas é feito pelo próprio presidente em algumas situações.
Em maio, o presidente recebeu os youtubers Bárbara Zambaldi, do Te Atualizei, e Allan Frutuoso, do Vista Pátria, ambos, canais investigados.
Em nota, o YouTube disse que suas recomendações “ajudam o usuário a descobrir assuntos e conteúdos do seu interesse” e são feitas com base em uma série de fatores, como histórico de exibição e de pesquisa de cada usuário, além de localização e data. A plataforma afirma oferecer “controles para que cada pessoa defina que tipo de informação podemos usar para calibrar nossas sugestões.”
Bernhard Rieder, pesquisador da Universidade de Amsterdã e criador do YouTube Data Tools, ferramenta utilizada pela Agência Pública, explica que os vídeos sugeridos pelo YouTube vêm principalmente de três fontes: os vídeos do próprio canal, as recomendações personalizadas – que usam dados individuais de cada pessoa e ficam marcadas como “recomendado para você” – e os vídeos relacionados.
O algoritmo é baseado em uma espécie de aprendizado automatizado, portanto, os canais não podem escolher que vídeos serão relacionados a ele, mas há maneiras de influenciar indiretamente as recomendações com palavras de descrição e temáticas, segundo explica Rieder.
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