Repórter especial da Folha de S.Paulo, Patrícia Campos Mello concedeu a entrevista a seguir ao Portal IMPRENSA poucos dias após receber o prêmio Maria Moors Cabot, da Faculdade de Jornalismo da Universidade Columbia (EUA), por seu trabalho como repórter.
Ao longo de mais de 20 anos de carreira, ela realizou grandes coberturas, como a guerra do Afeganistão e a epidemia do Ebola em Serra Leoa.
O tema principal da entrevista, porém, foi o lançamento, neste mês de julho, pela Companhia das Letras, de seu livro “A Máquina do Ódio: Notas de uma repórter sobre fake news e violência digital".
Baseada na cobertura que a jornalista realizou de eleições presidenciais em três países (Brasil, Estados Unidos e Índia), a obra busca dissecar o funcionamento das campanhas virtuais de desinformação, abordando as estratégias de manipulação das redes sociais por líderes populistas.
A obra também fala sobre o papel dos ataques a jornalistas e à imprensa nas metodologias digitais desses líderes populistas. Após publicar uma série de reportagens sobre disparo ilegal de mensagens em massa pelo WhatsApp nas eleições de 2018, a própria Patrícia se tornou vítima de ataques virtuais promovidos por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, como ela conta a seguir.
Portal IMPRENSA - Como foi o processo de produção do livro, incluindo entrevistas, depoimentos e edição? Quanto tempo durou cada etapa?
Patrícia Campos Mello - Eu comecei a escrever o livro no início de 2019. A ideia era analisar campanhas de desinformação em três países, Brasil, índia e Estados unidos, onde eu cobri as eleições (nos EUA as de 2008, 2012 e 2016 e, na índia, de 2014 e 2019). Em fevereiro deste ano, houve o episódio em que o presidente Bolsonaro fez ofensas de cunho sexual, então resolvemos incluir no livro aspectos de campanhas de difamação contra jornalistas.
O livro também mostra ataques contra a imprensa nesses três países e na Hungria, Turquia, Venezuela e Nicarágua.
Portal IMPRENSA - As mulheres jornalistas têm sido alvo de campanhas de ódio e difamação nas redes sociais. Você acha que isso se deve ao protagonismo das mulheres?
Patrícia Campos Mello - Eu acho que se deve à misoginia, há uma nítida tentativa de desqualificar jornalistas mulheres. O tipo de vocabulário usado para atacar jornalistas mulheres, o grau de agressividade, é bem pior do que o usado com nossos colegas homens – ainda que o nível de ataques contra eles também tenha subido no governo atual.
Portal IMPRENSA- Qual é a sua opinião sobre o PL das FaKe News, aprovado pelo Senado e que está sendo discutido na Câmara?
Patrícia Campos Mello - O PL vem ao encontro de uma constatação de que o atual ambiente informacional, onde circula uma quantidade colossal de desinformação, está corroendo a democracia. Mas é um projeto que precisa ser discutido com muito cuidado, para que algumas medidas não acabem resultando em violações de privacidade e redução da liberdade de expressão.
Portal IMPRENSA - De que forma você acha que a desinformação pode ser controlada?
Patrícia Campos Mello - A melhor maneira é com informação de qualidade, checagem, e com responsabilização de quem patrocina operações profissionais de fake News.
Portal IMPRENSA - Você acredita que nas eleições de 2020 a disseminação de fake news vai ser mais controlada?
Patrícia Campos Mello - Depois que publicamos as matérias sobre disparos em massa, o TSE aprovou regulamentação em novembro de 2019 que passou a proibir a prática. O próprio WhatsApp está processando agências de disparo em massa. Então acho que isso deve ser menos gritante desta vez. O problema é que sempre encontram outras maneiras de espalhar narrativas, outros instrumentos.
Portal IMPRENSA - Por conta da pandemia, como está sendo o lançamento livro?
Patrícia Campos Mello - Houve uma live na segunda-feira (27) promovida pela editora Companhia das Letras, com o doutor em sociologia Celso Rocha de Barros.
Portal IMPRENSA - Recentemente você ganhou o prêmio Maria Moors Cabot, da Faculdade de Jornalismo da Universidade de Columbia. O que isso representa neste momento?
Patrícia Campos Mello - Acho que é um sinal muito importante de apoio para jornalistas brasileiros, em especial mulheres, que vêm sofrendo campanhas de intimidação.