"Contribuir para a ampliação de vozes que foram invisibilizadas por tantos anos é o que me motiva", diz Larissa Darc

Gisele Sotto, em colaboração | 03/04/2019 12:49

"Quando a gente faz algo com um propósito, o serviço deixa de ser uma obrigação para se tornar uma missão de vida", comenta a jornalista Larissa Darc sobre o seu livro-reportagem 'Vem Cá', que tem como proposta fazer com que as pessoas comecem a conversar sobre a saúde sexual de lésbicas e bissexuais.


Larissa mergulhou no jornalismo aos 17 anos. Desde então produziu reportagens para a Agência Mural de Jornalismo das Periferias, Ponte Jornalismo e Nova Escola. Atualmente também desenvolve projetos de prevenção combinada de HIV/AIDS na Ecos Comunicação em Sexualidade.


Com o apoio da orientadora do seu TCC, a professora Renata Carraro, é que Larissa tomou a decisão de publicar o livro, lançado em março deste ano. Ela se formou em Jornalismo, em 2018, pela Faculdades Integradas Rio Branco e aqui compartilha sua experiência.

Crédito:Arquivo pessoal
Banca final do trabalho de conclusão de curso


Sobre o trabalho


O meu trabalho de conclusão de curso é um livro-reportagem sobre a saúde sexual de lésbicas e bissexuais. Ao longo de 6 capítulos, investigo questões ligadas à heteronormatividade, sexo entre vaginas, negligência médica, transmissão de IST, ginecologia feminista e prazer feminino.


A obra é uma publicação independente escrita, ilustrada, diagramada e revisada por mulheres. O prefácio é um texto de Beatriz Sanz, repórter do Portal R7.


Principais desafios ao longo da produção


Por se tratar de um tema pouco discutido, enfrentei muita dificuldade em encontrar dados, especialistas e estudos que embasassem a minha tese.


Contudo, ao contrário de outras reportagens que fiz ao longo da carreira, não tive dificuldade alguma em encontrar personagens que pudessem ilustrar a discriminação que lésbicas e bissexuais sofrem em consultórios médicos e as consequências da ausência de dispositivos de proteção de ist’s para o sexo entre vaginas.


O processo de produção, publicação e distribuição do livro também está sendo cansativo. Como não tenho o suporte de uma editora, sou responsável coordenar cada etapa do projeto. Felizmente, tenho contado com o apoio de mulheres incríveis, que estão se dedicando à obra por acreditarem na importância da causa.


Os aprendizados


O trabalho possibilitou que, gradualmente, eu deixasse de pensar como uma estagiária para começar a me ver como uma profissional. Sinto que estou muito mais segura e responsável depois de gerenciar tantos processos sozinha.


Significado dessa experiência


Na primeira orientação, a professora Renata Carraro me perguntou: “você quer fazer um livro para se formar ou quer realmente publicar?”. Desde o começo da graduação eu sabia que não iria dedicar tempo, dinheiro e energia em algo que não contribuísse de alguma forma com a sociedade. Então soube de cara que teria o apoio da minha orientadora para fazer algo realmente profissional.


O processo de produção foi intenso, uma vez que eu precisei conciliar o TCC com o estágio, projetos pessoais, disciplinas da faculdade e as 5 horas diárias que eu passava no transporte público. Eu não tinha um bom computador em casa, precisei juntar uma boa parte da minha bolsa-auxílio e abri mão de muita coisa para dar o meu melhor durante aquele período.


Quando apresentei o trabalho para a banca avaliadora, pude dizer com tranquilidade que aquele não era o fim do projeto. Ele estava apenas começando. Continuei trabalhando, em parceria com a designer e a revisora que eu contratei, em cada pedacinho da obra que ainda precisava de ajuste.


Faz três meses que eu me formei e ainda estou desenvolvendo o trabalho. Quando a gente faz algo com um propósito, o serviço deixa de ser uma obrigação para se tornar uma missão de vida.

Crédito:Tapera Taperá
Lançamento do livro


Como tem sido a repercussão do livro


O livro me trouxe, sim, muita realização pessoal e profissional. O lançamento foi um sucesso, vendi grande parte dos livros impressos, fui convidada para dar palestras e tenho recebido, todos os dias, mensagens de meninas interessadas em comprar um exemplar.


A obra já foi pauta em veículos como Ponte Jornalismo, Blog Mural da Folha de S.Paulo, Yahoo Notícias, Carta Capital, Papo de Homem e Rádio Globo. Isso trouxe bastante visibilidade para o projeto e me ajudou a cumprir com a principal missão da proposta: fazer com que as pessoas comecem a conversar sobre a saúde sexual de lésbicas e bissexuais.


Na minha concepção, essa é a grande vitória. Há anos essa pauta esteve confinada em bate-papos de lésbicas para lésbicas. Contribuir para a ampliação de vozes que foram invisibilizadas por tantos anos é o que me motiva a continuar trabalhando ainda mais por essa causa.


Conselhos para quem está fazendo o TCC


O TCC pode ser a melhor ou a pior coisa da sua vida. Quando eu tinha 16 anos, fiz um curso técnico em marketing que demandou um trabalho de conclusão de curso tão trabalhoso quanto o da graduação. Apesar de estar em um bom grupo, eu não gostava do tema e não me dedicava como deveria a ele. Até me formei com nota máxima, muito por mérito dos outros colegas, mas não me senti feliz com isso.


Dessa vez foi diferente. Optei por fazer um trabalho individual com o máximo de qualidade possível. Encontrei um assunto que eu julgava relevante, escolhi um formato que me estimulava e dei o meu melhor ao longo de todos esses meses. Hoje eu sinto orgulho de falar que essa é a minha obra.


Você, estudante de jornalismo, pode até fazer qualquer coisa. O seu diploma será o mesmo de outros colegas. Porém, será que vale a pena desperdiçar um ano da sua vida produzindo algo que não faz sentido?


Veja abaixo o debate de lançamento do livro "Vem Cá - Vamos conversar sobre a saúde sexual de lésbicas e bissexuais", de Larissa Darc, que teve como convidadas Angélica Bartholomeu, Beatriz Novaes e Beatriz Sanz. Evento aconteceu na Tapera Taperá, em São Paulo.



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