Opinião: "Jornalismo Digital chega ao Ensino Médio com a aprovação da Base Nacional Comum Curricular", por Marcio Gonçalves

Marcio Gonçalves | 13/12/2018 08:23
Crédito:Arquivo pessoal
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é o documento aprovado pelo Ministério da Educação que orienta escolas de todo o País a oferecer conteúdo em disciplinas que sejam comuns a todas. Os Ensinos Fundamental I e II já tiveram a BNCC homologada e, agora, caberá às escolas, até o final de 2019, adaptarem-se às diretrizes que o documento prescreve. Em relação ao Ensino Médio, a BNCC acabou de ser aprovada no último dia 4 de dezembro, faltando, apenas, depois disso, a homologação do Ministro da Educação. Em relação às práticas sociais do mundo digital, o documento menciona o ensino de Jornalismo Digital para essa garotada que possui entre 14 e 18 anos de idade.

É preciso lembrar que Jornalismo Digital é uma matéria que hoje faz parte da grade curricular mínima de diversos cursos de graduação em Jornalismo espalhados pelo Brasil. Neste nível do ensino superior, o conteúdo gira em torno de ensinar, em linhas gerais, o papel do jornalista na cultura digital; as ferramentas hipertextuais; o jornalismo digital em mídias sociais, a reportagem multimídia e todo o processo de produção midiática que o ciberespaço permite.

As propostas de trabalho sugeridas pela BNCC, para o Ensino Médio, devem possibilitar aos estudantes o acesso a “saberes sobre o mundo digital e a práticas da cultura digital”. Os exercícios para alcançar essa reflexão na escola devem também ser priorizados, já que impactam o dia a dia do estudante nos vários campos de atuação social. A geração que terá contato com esse ensino poderá desenvolver competências para encarar muitas das questões oriundas e/ou ressaltadas neste universo digital: a profusão de notícias falsas (fake news), de pós-verdades e de discursos de ódio nas mais variadas instâncias da internet e demais mídias.

Enquanto no jornalismo digital nas universidades a preocupação maior estaria, a princípio, nas técnicas de escrita no ciberespaço, para os jovens do novo Ensino Médio há orientações para o desenvolvimento de competências que as próximas gerações terão mais oportunidades de acesso. A BNCC prevê que as escolas consigam:

“Mobilizar práticas de linguagem no universo digital, considerando as dimensões técnicas, críticas, criativas, éticas e estéticas, para expandir as formas de produzir sentidos, de engajar-se em práticas autorais e coletivas, e de aprender a aprender nos campos da ciência, cultura, trabalho, informação e vida pessoal e coletiva. Essa competência específica diz respeito às práticas de linguagem em ambiente digital, que têm modificado as práticas de linguagem em diferentes campos de atuação social”.

O que os jovens e a sociedade em geral podem ganhar com essas propostas? No mínimo é formar estudantes com visão crítica, ética e estética. Além da parte estrutural e arquitetônica dos sistemas de informação, que possibilitará o aluno não somente explorar interfaces técnicas (como a das linguagens de programação ou de uso de ferramentas e aplicativos variados de edição de áudio, vídeo, imagens, de realidade aumentada, de criação de games, gifs, memes, infográficos etc.), poder desenvolver interfaces éticas que lhes permitam tanto triar e curar informações como produzir o novo com base no existente, será um grande ganho para o jornalismo e toda a população que não teve a chance de aprender tudo isso na escola.

A abertura da BNCC para o campo jornalístico-midiático possibilita o desenvolvimento de muitas atividades de leitura na escola: entrevista, reportagem, fotorreportagem, foto-denúncia, artigo de opinião, editorial, resenha crítica, crônica, comentário, debate, vlog noticioso, vlog cultural, meme, charge, charge digital, political remix, anúncio publicitário, propaganda, jingle, spot, entre outros). Pode-se ir além, pensando em gêneros mais complexos relacionados com a apuração e o relato de fatos e situações: reportagem multimídia e documentário, por exemplo.

O professor que ministrará as disciplinas que envolvam tudo isso devem ser grandes entusiastas da cultura digital. Se quiser, alguns exemplos, no Brasil, de jornalismo digital, podem servir como inspiração: UOL Tab e Nexo. É preciso enxergar a chance de possibilitar que, ao longo dos anos, os estudantes experimentem, de forma significativa, diferentes papeis envolvendo a circulação de informação e opinião: repórter, fotorrepórter, editor, comentador, articulista, curador, leitor (que compartilha, comenta e avalia), crítico de produções culturais, booktuber, vlogger e outros. Neste sentido, entra em questão o letramento midiático e a possibilidade de formação de consumidores críticos e, acima de tudo, de produtores de conteúdo de maior valor diante de uma sociedade cada vez mais interconectada e com comunicação mediada por computadores e internet.

*Marcio Gonçalves é doutor em Ciência da Informação e líder do projeto “Aula Sem Paredes” (www.aulasemparedes.com.br). É professor de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação no Ensino Fundamental I e II e no Ensino Médio na Escola Eliezer Max e docente no Ibmec, na Facha e na Unesa. É autor de livros nas áreas da comunicação social. O livro mais recente foi lançado pela Editora Matrix sob o título Inteligência Digital.

Leia também